Os efeitos da nova lei do superendividamento no mercado imobiliário?

A lei do superendividamento (Lei n° 14.181/21) entrou em vigor no dia 1° de julho de 2021. Ela altera o Código de Defesa do Consumidor (CDC) e define condutas que visam a evitar o acúmulo de dívidas pelos consumidores.
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Por Vince
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O consumidor é considerado a parte mais frágil de uma negociação de crédito. Isso porque há empresas que visam ao lucro próprio, sem se importar com a condição do devedor. Por essa razão, foi elaborada a nova lei do superendividamento. 

Você sabe o que ela significa? A norma visa a proteger o consumidor de operações de crédito que podem gerar o acúmulo de dívidas e a insolvência. Como no mercado imobiliário existem transações de crédito e financiamento de alto valor, é imprescindível que o profissional da área entenda o assunto.

Quer saber mais sobre essa nova lei, os temas abordados por ela e como a legislação impacta o mercado imobiliário? Então continue a leitura e confira!

O que é a lei do superendividamento? 

A lei do superendividamento (Lei n° 14.181/21) entrou em vigor no dia 1° de julho de 2021. Ela altera o Código de Defesa do Consumidor (CDC) e define condutas que visam a evitar o acúmulo de dívidas pelos consumidores. 

Esse superendividamento é definido como a impossibilidade de o indivíduo pagar seus débitos sem comprometer o valor mínimo para manter as condições de uma vida digna. Assim, a lei determina um plano de pagamento das dívidas baseado na proteção da condição mínima existencial do consumidor. 

A lei do superendividamento visa a proteger o consumidor, confira seus demais objetivos.
A lei do superendividamento visa a proteger o consumidor, confira seus demais objetivos. Fonte: Blueprint

Contudo, a lei não estabelece a quantia mínima ou um percentual para definir o que é o mínimo existencial. Por esse motivo, o consumidor endividado é quem deve atestar essa condição. Para tanto, ele pode demonstrar a comprovação da renda e as suas faturas de consumo.

Dessa maneira, a lei criou um instrumento de renegociação de dívidas semelhante às recuperações judiciais realizadas pelas empresas. Nesse caso, a pessoa física pode solicitar uma negociação com os credores de uma só vez, resultando em um plano de pagamentos condizente com a sua realidade.

Ademais, a lei é pautada no crédito responsável e na boa-fé contratual. Isso significa que, com as medidas, as empresas credoras passam a ter maiores responsabilidades ao oferecer crédito aos consumidores. 

O que essa lei prevê? 

Agora que você já sabe o que é a lei do superendividamento, deve compreender quais são as medidas previstas por ela. Confira a seguir!

Proteção ao consumidor 

Sem o regulamento, os consumidores impossibilitados de honrar as dívidas ficavam à mercê das instituições financeiras nas negociações. Dessa maneira, não era incomum que eles fizessem acordos desfavoráveis que, muitas vezes, resultavam em mais débitos.

Com a lei, as negociações são mais transparentes, visando à recuperação financeira e considerando o poder de compra do consumidor. Além disso, há maior proteção do indivíduo, já que a lei proíbe a falta de avaliação financeira do consumidor no processo. 

Recuperação judicial

Como você viu, a renegociação de dívidas pode ser realizada como uma recuperação judicial. Nesse caso, o devedor precisa solicitar ao judiciário a revisão dos contratos e apresentar um plano de pagamento com prazo de, no máximo, cinco anos.

Caso não haja acordo entre as partes, o juiz pode determinar um plano judicial obrigatório para credores e consumidor. Nesse caso, são estabelecidos valores, prazos e formas de pagamento que respeitam a condição mínima existencial do indivíduo.

A quantia mínima da renda que o endividado utiliza para pagar suas despesas básicas, portanto, não pode ser usada para quitar os débitos. Essa medida procura evitar a contração de novas dívidas para o pagamento de contas básicas, interrompendo o ciclo de endividamento.

Transparência na contratação de crédito

A lei do superendividamento estabelece a obrigatoriedade de informar sobre os custos totais do crédito contratado. Assim, a norma proíbe as instituições de ocultar os riscos reais da contratação de um empréstimo.

Desse modo, o consumidor deve ter acesso fácil a informações sobre juros, taxas, tarifas e encargos de atraso antes da contratação do crédito. Isso deve acontecer com o fornecimento de uma cópia do contrato com todos os dados descritos. 

Caso a instituição deixe de entregar esse documento, o consumidor poderá reivindicar seus diretos, pois a prática é considerada ilegal e abusiva. 

Proibição de assédio e pressão ao cliente

Premiações e descontos para aderir às ofertas de crédito passam a ser ilegais com a lei. O motivo está no fato de que esse tipo de conduta pode ser considerado assédio. Assim, a determinação visa a proteger os consumidores, especialmente pessoas vulneráveis, como idosos e analfabetos.

Caso o consumidor se sinta pressionado durante o processo de contratação, pode denunciar a instituição. A queixa pode ser feita à central de atendimento da financeira. Se o problema não for resolvido, é importante falar com a ouvidoria e enviar a denúncia para o Banco Central.

Responsabilidade pela concessão de crédito

Com a nova lei, os bancos e as financeiras são corresponsáveis por empréstimos e financiamentos e devem estar cientes do risco de inadimplência das operações. Assim, é vedada a oferta que indicar que a concessão de crédito pode ser realizada sem consulta aos serviços de proteção ao crédito. 

Além disso, é proibida a propaganda que oculta ou dificulta a compreensão sobre os riscos da venda a prazo, ou da contratação de crédito. Essa medida visa a não estimular o endividamento do devedor.

Desistência do empréstimo

A lei do superendividamento também assegura a desistência do empréstimo. Se o consumidor quiser cancelar o crédito contratado em até sete dias após o fechamento do contrato, ele pode fazer a solicitação sem a necessidade de apresentar justificativas.

Dessa maneira, as instituições devem oferecer formulários físicos e eletrônicos para que o cliente solicite a devolução dos valores e eventuais juros.

Limite consignado

A lei mantém o limite para crédito consignado em 30% do salário para o pagamento de parcelas. Entretanto, agora ela prevê um limite de 5% do salário líquido para pagamento de dívidas de cartão de crédito.

Desse modo, se a instituição não cumprir a determinação, é possível entrar com processo na justiça pedindo a revisão do contrato. Nesse caso, o juiz pode determinar o aumento no prazo de pagamento sem acréscimo na dívida, além da redução de encargos.

Suporte ao consumidor

Para que a nova lei seja respeitada, será necessário um trabalho de suporte e acolhimento do consumidor e padronização nesses processos. Por essa razão, o Banco Central, o Procon e a Defensoria Pública terão treinamentos para incorporar as novas regulamentações. 

Educação financeira 

A educação financeira é valorizada na nova lei. A intenção é estimular o consumo consciente e a utilização sustentável dos recursos financeiros. Por isso, a mudança possibilita ações que contribuem para que o consumidor se informe sobre as condições do empréstimo e saiba analisar os prós e os contras da contratação. 

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Quais os impactos gerais no dia a dia de pessoas e empresas? 

Agora que você já sabe os temas previstos na lei do superendividamento, deve entender qual será o impacto dessas normas no dia a dia dos consumidores. Essa normativa é de suma importância na proteção das pessoas que contraem dívidas diante de uma oferta de crédito fácil.

Gráfico mostra a informação apurada pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), sobre o nível de endividamento médio das famílias brasileiras em 2021, que foi o maior em 11 anos.
De acordo com a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), o nível de endividamento médio das famílias brasileiras em 2021 foi o maior em 11 anos. Fonte: G1 - Globo

Isso porque, muitas vezes, os débitos se tornam impagáveis, especialmente os concedidos sem critérios pelas instituições. Por consequência, essa maneira de conceder crédito pode causar a insolvência dos consumidores. 

Portanto, na prática, a medida gera mais problemas para quem procura linhas de crédito para solucionar condições financeiras difíceis. Nesse sentido, a regulamentação desse tipo de oferta contribui para a prevenção do superendividamento de pessoas e empresas.

Quais os efeitos no mercado imobiliário?

Após entender os impactos gerais da lei do superendividamento para as pessoas e os negócios, é importante saber quais são os efeitos da regulamentação no mercado imobiliário. Como as linhas de crédito são comuns nas negociações de imóveis, esse conhecimento pode auxiliar as vendas. 

Saiba mais sobre os efeitos dessa lei no mercado imobiliário!

Menos riscos para os envolvidos

Em um empréstimo, a financeira e o consumidor assumem riscos de inadimplência e de não conseguir arcar com o compromisso, respectivamente. Nesse sentido, o financiamento imobiliário está entre as modalidades de crédito de maior risco, pois as parcelas costumam ser altas e o prazo de pagamento é longo.

Vale destacar que quanto maior o prazo de parcelamento, mais imprevisível é o planejamento. Afinal, podem acontecer mudanças importantes na situação do consumidor — como a perda do emprego. Contudo, em caso de inadimplência, o imóvel financiado pode ser tomado pela instituição financeira. 

Por essa razão, uma lei mais rígida em relação às regras para a concessão de crédito pode evitar que pessoas percam os valores investidos durante anos, na hipótese de dificuldades financeiras. 

Exclusão do financiamento da recuperação judicial

Embora a lei do superendividamento preveja um processo judicial para a renegociação de dívidas, o financiamento imobiliário é excluído desse acordo.

Essa medida é pautada no entendimento de que o financiamento é destinado à formação de patrimônio e o imóvel já é uma garantia para o débito. Além disso, essa modalidade de crédito não colocaria em risco a sobrevivência da pessoa.

Desse modo, em relação à inadimplência do consumidor, nada muda no mercado imobiliário. Isso significa que a instituição financeira pode continuar com os mesmos procedimentos para reaver os valores emprestados. É o caso, por exemplo, do leilão extrajudicial do imóvel, em cenários de alienação fiduciária.

Mais responsabilidades para as instituições

A lei do superendividamento também trouxe mais responsabilidades para as empresas que oferecem crédito ou financiamento. Afinal, os credores não podem fornecer crédito sem análise da condição financeira do cliente. Inclusive, são previstas penalidades em caso de descumprimento.

Para o consumidor, especialmente o mais vulnerável, a lei previne que ele assuma dívidas maiores que as suas capacidades financeiras de honrá-las. Isso impacta diretamente a maneira com que ele lida com o crédito, estimulando a responsabilidade de sua situação financeira.

Por que o profissional do setor imobiliário precisa conhecer o tema? 

Após saber mais sobre a lei do superendividamento, você deve entender por que o profissional do setor imobiliário precisa conhecer o tema. A verdade é que todos os envolvidos com vendas a prazo e linhas de crédito devem conhecer a fundo a nova lei, independentemente do mercado de atuação. 

Isso porque o descumprimento da normativa pode gerar problemas judiciais e transtornos financeiros para os envolvidos. Para entender melhor, confira um exemplo!

Exemplo prático

Nem sempre é fácil visualizar os impactos de uma nova lei. No caso das regras sobre o superendividamento e a repercussão da norma no mercado imobiliário, um exemplo que auxilia a compreensão é a venda de imóveis que dispensam a consulta aos cadastros de crédito. 

Essa prática costuma ser aplicada em vendas de imóveis na planta, já que as primeiras etapas são negociadas diretamente com as construtoras. Isso ajuda a ampliar o caixa para que elas captem recursos para o andamento das obras. 

Como as chaves só são entregues após a quitação ou a realização de um financiamento imobiliário, a operação causaria menos riscos ao vendedor. Entretanto, a solicitação da linha de crédito com uma instituição financeira acontece após a conclusão da obra. 

A lei do superendividamento é capaz de criar melhores relações de consumo entre as partes, confira como.
A lei do superendividamento é capaz de criar melhores relações de consumo entre as partes, confira como. Fonte: Blueprint

Nesse momento, o consumidor terá quitado uma parte do contrato, tendo se desfeito de parte de seu capital. Por outro lado, para conceder essa modalidade de crédito imobiliário, o banco ou a financeira faz uma análise rigorosa a fim de entender se o interessado tem condições de assumir a dívida.

Se nessa etapa o comprador não for aprovado pela instituição financeira, ele pode ter a maior parte do seu investimento perdido. Portanto, é fundamental que os profissionais do mercado imobiliário conheçam a nova lei para dar suporte nas negociações. 

Além disso, os contratos devem ser tratados com o máximo de transparência e o corretor pode ajudar o cliente a analisar as condições. Afinal, é preciso que condições como as taxas de juros imobiliários, os encargos e a análise de crédito, por exemplo, estejam claras. 

Assim, é possível melhorar as relações de consumo, gerando negócios de qualidade e que visam ao bem mútuo. Ao mesmo tempo, o profissional ou a imobiliária ganham reconhecimento entre os consumidores diante da sua conduta alinhada à legislação e ao suporte oferecido.

Conclusão

Como você viu, a lei do superendividamento tem o objetivo de proteger o consumidor do acúmulo de dívidas que podem levá-lo à insolvência. Como ela também afeta o mercado imobiliário, é importante que o profissional do setor esteja ciente e aplique a nova legislação em seu dia a dia.

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